quarta-feira, 15 de fevereiro de 2012

Amor S/A


Homens precavidos estão assinando
"contratos de não-compromisso"
com namoradas

Depois do pacto antenupcial – aquele em que pombinhos prestes a subir ao altar decidem na ponta do lápis quem fica com o quê em caso de separação –, surge nos grandes escritórios de advocacia um novo tipo de contrato destinado a amantes precavidos: o pacto de namoro. A finalidade é basicamente a mesma dos acordos pré-nupciais: proteger a parte mais rica de ataques patrimoniais que, numa eventual ruptura, possam vir a ser desferidos pela parte menos aquinhoada. A diferença é que, nesse caso, não há casamento à vista. Ao contrário, os contratos de namoro servem justamente para declarar, clara e formalmente, que o casal mantém uma relação de "afeto descompromissado" e nada além disso. Se um dia todo aquele amor acabar, o lado pobre não poderá ir aos tribunais reclamar direitos de ex-cônjuge.
Parece paranóia, mas esse peculiar contrato de não-compromisso pretende proteger os espíritos precavidos da liberalidade com que a chamada união estável – ou o popular casamento sem papel assinado – é interpretada pela lei. Com as mudanças introduzidas a partir de 1996, para que uma relação seja reconhecida como união estável, homem e mulher não precisam ter cinco anos de vida em comum nem sequer viver sob o mesmo teto, as exigências vigentes até então. Atualmente, basta que uma das partes prove que viveu com a outra relação "duradoura, pública e contínua, com o objetivo de constituir família". Diante de termos vagos assim, amantes mais desconfiados preferem não dar chance ao azar. "Não se passa uma semana sem que alguém me ligue: doutora, estou namorando há dois anos. Já está perigoso?", conta a advogada Priscila Corrêa da Fonseca. Uma das mais respeitadas na área de direito de família, ela tem na ponta da língua uma lista de conselhos para evitar que as relações de seus abonados clientes possam vir a ser caracterizadas como uniões estáveis: as orientações vão desde não atender ao telefone na casa da namorada até evitar deixar lá objetos de uso pessoal. "Roupas íntimas, só em cima da cadeira. Na gaveta dela, jamais", enfatiza.


Contrato feito em São Paulo: só "grande afeição"

No ano passado, o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, tido como um dos mais liberais do país, julgou mais de 150 processos de reconhecimento de união estável movidos por pessoas, em geral mulheres, que conviveram com seus alegados companheiros em casas separadas. Nesses casos, afirma a desembargadora Maria Berenice Dias, "em havendo justificativa para a não-coabitação, a tendência do tribunal é reconhecer a união".
&Eaco Sul, tido como um dos mais liberais do país, julgou mais de 150 processos de reconhecimento de união estável movidos por pessoas, em geral mulheres, que conviveram com seus alegados companheiros em casas separadas. Nesses casos, afirma a desembargadora Maria Berenice Dias, "em havendo justificativa para a não-coabitação, a tendência do tribunal é reconhecer a união".
É o tipo de declaração que faz tremer os tigrões escaldados – clientes típicos dos contratos de namoro. "Quem mais recorre a esse instrumento são homens maduros, que têm um patrimônio a zelar e que já sofreram prejuízos emocionais e financeiros em relações anteriores", afirma o advogado José Roberto Pacheco. Só no mês passado, ele celebrou dois contratos de namoro, ambos envolvendo homens bem mais velhos que suas parceiras. Podem se considerar a salvo? Não totalmente. Na opinião de alguns juristas, contratos desse tipo são sujeitos a contestação. "Ou bem o casal está vivendo uma relação descompromissada, ou bem está vivendo uma união estável. Um documento não tem o poder de mudar uma situação. Fazer contrato de namoro é se precaver além da medida do razoável", afirma a advogada especializada em direito de família Renata Di Pierro. O desembargador Antônio César Peluso, do Tribunal de Justiça de São Paulo, concorda. "Ainda que os limites entre namoro e união estável sejam fugidios, os envolvidos sabem muito bem qual é a natureza da relação. Compromissos afetivos implicam responsabilidades recíprocas, incluindo as financeiras. As pessoas não podem fugir a elas", avisa.

CONSELHOS ESPERTOS
Conheça as orientações que advogados dão a clientes para evitar que sua relação amorosa seja caracterizada como união estável
ü  Não dormir com muita freqüência na casa dela
ü  Não deixar ali objetos de uso pessoal
ü  Não permitir que ela gerencie sua casa (por exemplo: dar ordens à empregada ou fazer supermercado)
ü  Não colocá-la como dependente em cartão de crédito, plano de saúde ou clube
ü  Nunca apresentá-la a amigos com outro título que não "namorada"
ü  Não ter filhos com ela
 Fontes: advogados Priscila Corrêa da Fonseca e José Roberto Pacheco