terça-feira, 7 de junho de 2016

UM BEIJO É SEMPRE ATO LIBIDINOSO? UM BEIJO DEVE SER CONSIDERADO ESTUPRO?




Li que mais um folião foi preso e enquadrado no crime de estupro, desta feita, estupro de vulnerável, já que a vítima tem menos de 14 anos. O folião, mais empolgado, alcoolizado, a segurou roubou um beijo, a menina, certamente assustada, escapuliu das mãos dele, mas sofreu um arranhão no braço, motivo que leva o delegado a o enquadrar em estupro de vulnerável mediante violência, vai dar uma pena de uns dez anos ou mais.

Neste ano já tivemos outro caso, na Bahia, onde o criminoso pegou 8 anos por furtar um beijo. Gostaria que os amigos lessem o que posto a seguir, uma ponderação sobre este “ato libidinoso” que leva a uma condenação por estupro, lembrando que também é aplicável a mulheres. Confesso já ter sido vítima, certa vez, trabalhando no carnaval, uma se levantou e apertou minha bunda… Merecia ser ela presa por estupro? E um beijo, rápido e furtivo, merece uma pena tão grave? Leiam o que posto abaixo:


Um beijo comum ou um beijo lascivo é um ato libidinoso? Ele, o beijo lascivo, tem caráter sexual (libido), mas isso seria um estupro? Ou seria mera importunação ofensiva ao pudor? Porque a lei ficou com vergonha de falar sobre sexo de forma clara, acabou dando margem a dúvidas e longos debates entre juristas e magistrados. Ha imprecisão do alcance da expressão ato libidinoso diverso da conjunção carnal.
A Lei n. 12.015/09 revogou o artigo 214 do Código Penal, porém, deslocou a expressão ato libidinoso diverso da conjunção carnal para o crime de estupro, no artigo 213 do referido código. A nova lei, por sua vez, extinguiu a autonomia do crime de atentado violento ao pudor, mas manteve a presença da conduta citada em outro dispositivo, sem dar importância, novamente, ao estabelecimento dos limites de sua abrangência.

O Princípio da Legalidade assegura que qualquer indivíduo seja processado ou condenado apenas quando exista lei que tipifique a sua conduta (e abrangência) e que estabeleça pena para a mesma. Esclarece-se que o dispositivo legal é bastante claro ao mencionar que a conduta criminosa deve estar prevista em lei, bem como a pena da conduta delituosa.

Seria aplicável a um beijo rapidamente furtado o princípio da insignificância?

“O princípio da insignificância – que considera necessária, na aferição do relevo material da tipicidade penal,a presença de certos vetores, tais como:

(a) a mínima ofensividade da conduta do agente
(b) a nenhuma periculosidade social da ação
(c) o reduzidíssimo grau de reprovabilidade do comportamento e
(d) a inexpressividade da lesão jurídica provocada

Apoiou-se, em seu processo de formulação teórica, no reconhecimento de que o caráter subsidiário do sistema penal reclama e impõe, em função dos próprios objetivos por ele visados, a intervenção mínima do Poder Público (BRASIL, 2004, grifo do autor).”

O TJ-SP (Tribunal de Justiça de São Paulo) absolveu um homem de 30 anos acusado de estupro de vulnerável após ser flagrado pela Polícia Militar beijando uma garota menor de 14 anos de idade. Para a 4ª Câmara de Direito Criminal, “o ato, por si só, não pode ser considerado como de conotação libidinosa”. Concluiu a 4ª Câmara de Direito Criminal que “apesar de existirem fortes indícios de que ele teria conhecimento da idade da menor, não há no processo provas suficientes a comprovar que os beijos trocados entre ele e ela teriam conotação libidinosa, até mesmo porque estes se deram em curto espaço de tempo”.

Entenderam os desembargadores, que a conduta do homem configurou tão somente uma contravenção penal, já que o texto da lei de contravenções penais caracteriza como tal “importunar alguém, em lugar público ou acessível ao público, de modo ofensivo ao pudor”. Sendo assim aplicou a pena de 10 dias multa (calculada com base no salário mínimo e paga em dinheiro).

A questão, portanto, é saber se esse beijo dado na boca contra a vontade da pessoa que o suporta pode configurar crime de estupro. De fato, a nova lei prevê que será também considerado como tal a conduta de ‘constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a praticar ou permitir que com ele se pratique outro ato libidinoso’, que é aquele destinado a satisfazer o apetite sexual.

Guilherme de Souza Nucci nos ensina que ato libidinoso diverso da conjunção carnal, no caso do beijo, apenas abrangeria o beijo lascivo, nos indicando que “Quanto ao beijo, excluem-se aqueles que forem castos, furtivos ou brevíssimos… Incluem-se os beijos voluptuosos, com “longa e intensa descarga de libido”, como menciona Hungria, dados na boca.” (Código Penal Comentado – RT – pg 787).

Que fique claro meu questionamento: Não estou questionando se pode ou não dar um beijo sem consentimento, é óbvio que não. Questionou é a tipificação penal e a pena imposta, igual ao estupro através de conjunção carnal.

Lembremos que a Lei Penal é feita de verbos. A lei antidrogas tem uma infinidade de verbos que caracterizam e tipificam as condutas. A Lei n. 12.015/09 não tipificou as condutas, deixou vago para interpretação de cada Juiz, Desembargador e Tribunais o que é ato libidinoso diverso de conjunção carnal, já tendo um Magistrado se manifestado que até um gesto pode ter intenção sexual e ser considerado estupro se este for libidinoso, mesmo sem contato físico. Mas o que é libidinoso? Quais os verbos que descrevem? Em breve correremos o risco de ao olhar para uma pessoa bonita na rua, se esta não gostar, sermos, por um Magistrado conservador, condenados por estupro.


Um comentário:

  1. Concordo plenamente com sua colocação diante do crime de estupro, a ideia de condenar uma pessoa por conta de um beijo roubado, não seria justo condena-lo a 8 anos de prisão ou mais, dependo da condição da vítima sendo ela vulnerável ou não.
    É bem relevante sua opinião acerca do assunto tão comentado.

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